Ernest Cline tem 45 anos e é um desses sujeitos que cresceu moldado pela cultura dos anos 80. Jogava todas as novidades do momento, assistia aos filmes sensações que eram lançados e, como tantos outros de seu tempo, e posteriormente, que cresceram com as obras oitentistas – principalmente -, não é de se espantar que seu primeiro livro, “Jogador Nº 1”, tenha sido um sucesso de vendas. Toda a história é moldada em cima de referências – os chamados easter eggs -, tanto de filmes quanto de jogos do período, integrados numa realidade futurista onde toda a sociedade vive suas vidas numa realidade virtual chamada Oasis. A morte do seu criador, James Halliday, sucede com a divulgação de um vídeo do mesmo apresentando uma caça a um easter egg, que quem encontrar herdará toda sua fortuna, incluindo o domínio total de sua maior criação, o Oasis.
Diversos diretores poderiam ter dirigido “Jogador Nº 1” e o filme continuaria com grandes possibilidades de ser um entretenimento delicioso. Diretores como J. J Abrams, Robert Zemeckis, Joe Johnston e vários outros – que obtiveram nos anos 80 toda sua formação cultural – com o material de Cline em mãos, iriam entrar em êxtase para inserir toda a nerdice que consumiram na vida. Mas foi Steven Spielberg quem aceitou dirigir o projeto. Justamente a pessoa que remodelou os anos 80 com filmes que revolucionaram o cinema – tanto em linguagem quanto visualmente. Spielberg é o mentor de todos esses diretores que seriam também de grande serventia a este filme, mas com o mestre assumindo o comando de “Jogador Nº 1”, aos 71 anos de idade ele prova que continua com sua criatividade intacta, e mostra o porque detém a honra de ser o diretor mais influente do cinema.
Ao assistir “Jogador Nº 1” me senti como se estivesse voltando novamente ao livro. As adaptações realizadas para tornar a trama mais dinâmica, e frenética ao público atual, são bem vindas e respeitam o texto de Cline. Toda a essência, e as principais passagens da obra literária, são tratadas com carinho e desenvolvidas com sensibilidade, fluidez e vivacidade visual. Característica que nas mãos de Spielberg ganha ainda mais contorno, estética e estofo.
“Jogador Nº 1” possui uma trama bastante simplória. Recicla o velho clichê de vilão e mocinho tão costumeiros nos filmes da década de 80. Faz parte do pacote! No entanto, é justamente no desenvolvimento deste universo virtual, na ação e interação dos personagens que reside toda a capacidade do filme de nos entreter a um nível surpreendente. Nunca fui fã de jogar vídeo games, mas me senti dentro de um, participando de um jogo em tempo real. E como amante do cinema, as diversas referências a filmes clássicos são a cereja no topo do bolo que tornam a experiência de assistir “Jogador Nº 1” ainda mais identificável, imersiva e extasiante.
Aliás, as referências, como no livro, são o grande chamariz da obra. Os dois materiais são fundamentados em cima da nostalgia, mas mais ainda no filme, o impacto consegue ser muito maior por justamente existir a possibilidade de visualizar os personagens e jogos que fizeram parte da nossa vida. Outro ponto positivo do longa, e requerido por Spielberg, é nunca tornar as referências como prioridades. Elas existem aos montes mas nunca tomam o interesse do público pelo desenvolvimento da história. E muitas até se tornam parte fundamental da mesma.
Uma das minhas poucas ressalvas que tenho é com a trilha sonora. John Williams estava trabalhar aqui. Quem assumiu o lugar do frequente colaborador de Spielberg foi Alan Silvestre – conhecido pela música de clássicos como “De Volta Para o Futuro” e “Forrest Gump”, e também o tema principal da Marvel Studios no cinema. É outro grande compositor responsável por trilhas sonoras memoráveis, mas que aqui, infelizmente, não cria nenhum tema instigante ou que dure após o término da obra. Exemplo: assista ao primeiro trailer de “Jogador Nº 1” exibido na Comic Con San Diego do ano passado. A trilha é espetacular! Quando Silvestre inova a melodia de “Pure Imagination”, música de “A Fantástica Fábrica de Chocolate” de 1971, injetando grave e tornando o ritmo lento da melodia original em uma composição épica, confesso, que fiquei bastante arrepiado. Já no filme, particularmente, não consegui encontrar nenhum momento com uma trilha tão competente como esta que foi apresentada no trailer.
Mas “Jogador Nº 1” não é prejudicado, e o filme é uma diversão garantida com um Steven Spielberg em plena disposição, criatividade e empolgação. Uma ficção científica/aventura/fantasia que merece uma revisita e que promete deixar um sorriso no rosto de muito marmanjo. E, claro, da garotada em geral. É um entretenimento de alto nível, e muitíssimo empolgante. Um filme pipoca da melhor qualidade realizado pelo mestre do gênero. Recomendado!
Ready Player One-EUA
Ano: 2018 – Dirigido por: Steven Spielberg
Elenco: Tye Sheridan, Olivia Cooke, Ben Mendelsohn, Simon Pegg, Mark Rylance…
Sinopse: Num futuro distópico, em 2044, Wade Watts (Tye Sheridan), como o resto da humanidade, prefere a realidade virtual do jogo OASIS ao mundo real. Quando o criador do jogo, o excêntrico James Halliday (Mark Rylance) morre, os jogadores devem descobrir a chave de um quebra-cabeça diabólico para conquistar sua fortuna inestimável. Para vencer, porém, Watts terá de abandonar a existência virtual e ceder a uma vida de amor e realidade da qual sempre tentou fugir.